segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

A Laranja Mecânica


Título: A laranja mecânica
Autor: Anthony Burgess
Editora: Alfaguara
Tradução: Vasco Gato
337 páginas, capa mole

Classificação: **** (4/5)

-Então e agora, hum?

É assim que começa a história de Alex, que se eu tivesse de definir numa palavra seria perturbadora. Alex é um jovem de 15 anos que vibra com música clássica e é o líder carismático do seu grupo de  drugos (amigos) que, como os jovens da sua época, se divertem consumindo drogas, lutando, roubando, violando e espancando os habitantes de uma Londres algures no futuro.
Nesta história dividida em três partes e narrada na primeira pessoa Alex irá descrever, usando o nadsate, ou seja uma gíria própria da juventude da época, os seus actos criminosos, a sua prisão e posterior reeducação ao abrigo do inovador programa governamental  "Ludovico" que promete fazer dele um bom rapaz e por último a sua vida após esse programa. 
Apesar das múltiplas cenas de violência este não é um livro sobre a violência por si só mas sim sobre  o liberdade arbítrio que nos define (ou não) enquanto humanos e a própria natureza do ser humano: seremos intrinsecamente bons ou maus? 
Alex acredita ser mau, não ter escolhido ser mau mas ser intrinsecamente mau. Diverte-se e tem prazer com o sofrimento alheio e nunca sente qualquer tipo de remorsos sobre os actos praticados. Após ir para a prisão não se torna menos violento, aliás é como se a violência estivesse institucionalizada e por isso o seu comportamento mantém-se. 
Ele será a cobaia de um novo programa governamental, que promete transformar criminosos violentíssimos em cidadãos exemplares, incapazes de más acções. Este programa baseia-se na terapia da aversão, ou seja, associar um estímulo muito negativo a imagens de violência extrema de modo a que sempre que Alex se sentisse tentado a praticar actos de violência ele tivesse uma reacção física muito intensa que o impedisse. O nosso "humilde" narrador torna-se assim incapaz de cometer más acções, sendo impelido a praticar boas acções de modo a evitar as consequências nefastas. Alex torna-se assim uma pessoa boa, não por livre escolha mas sim por incapacidade de ser mau.  
Depois desta perda de identidade ele será um instrumento nas mãos da oposição política, que se opõe tanto ao programa Ludovico como a outras medidas do governo que incluem uma força policial violentíssima para manter a ordem.  
O último capítulo, que foi eliminado das primeiras edições deste livro mostra afinal em que tipo de pessoa é que Alex se tornou...
Esta é uma leitura um pouco estranha e exigente, devido ao dialecto utilizado, que no original é uma mistura entre russo e calão rimado inglês, que me levou a uma consulta compulsiva do glossário durante as primeiras dezenas de páginas do livro, mas que penso que atenua um pouco a natureza gráfica que as descrições de violência poderiam ter. O narrador vai sempre utilizando um tom um pouco irónico, exagerado e até cómico ao longo da história. Apesar disso é um livro muito original e interessante devido ao dilemas éticos que levanta: será aceitável o governo condicionar o comportamento dos cidadãos? Até mesmo para transformar os bons em maus? E quais serão as consequências desse condicionamento? 
Nesta edição especial de 50ª aniversário o trabalho de tradução realizado é francamente notável, também inclui alguns extras como reproduções de algumas páginas do texto original, ensaios, artigos e críticas, notas ao texto e o indispensável glossário de Nadsate. 
Recomendo vivamente esta obra a qualquer leitor que goste de distopias e que queira ler algo verdadeiramente original (e que de preferência não seja facilmente impressionável).
Não poderia também deixar de referir a famosíssima adaptação cinematográfica desta obra por Stanley Kubrick, que apesar de apresentar algumas diferenças em relação ao livro vale muito a pena. 


  





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