segunda-feira, 11 de março de 2013

Guia Para Um Final Feliz


Título: Guia Para Um Final Feliz
Autor: Matthew Quick
Editora: Editorial Presença
Tradução: António Infante e Miguel Romeira
288, capa mole

Classificação: **** (4/5)


Se não fosse o burburinho gerado pelos Óscares provavelmente não teria escolhido este livro para ler, à primeira vista parecia apenas mais um romance leve bem comum. No entanto é mais do que isso, tem um humor bastante peculiar e personagens diferentes e interessantes.
Pat Peoples, o narrador, acaba de sair da instituição psiquiátrica onde esteve quatro anos devido a um trauma grave, sem memória dos acontecimentos que o levaram ao internamento nem dos últimos anos Pat acredita que a sua missão na vida é autoaperfeiçoar-se a todos os níveis. Se conseguir atingir a perfeição a nível físico, emocional e intelectual ele acredita que será recompensado com o final feliz que tanto quer, o regresso da sua mulher. 
Acompanhamos então o regresso de Pat à normalidade, a sua verdadeira obsessão para recuperar a esposa e a luta por conseguir alguma sanidade mental. Ele terá que lidar com uma mãe superprotectora, e um pai muito pouco comunicativo cujo humor depende dos resultados da sua equipa de futebol do coração, com o reatar de relações com o irmão e amigos e tornar-se de novo um membro normal da sociedade. Pat irá também fazer novas amizades, a sua vizinha Tiffany igualmente mentalmente perturbada, irá ter um papel preponderante para Pat retomar a sua vida. 
Devido ás características psicológicas do narrador este romance é muito interessante de acompanhar, fortemente marcado pela obsessão mas também pela optimismo, esperança e amor leva o leitor a torcer pela felicidade de Pat e envolver-se na sua história. 
Tem também um certo mistério: não sabemos qual foi o acontecimento traumático que levou ao seu internamento nem a razão do total afastamento da mulher, mas queremos descobrir a todo o custo, o que me levou a devorar capítulos e capítulos sem descanso. 
Para quem gosta de livros este história tem pormenores interessantes, como parte da missão de autoaperfeiçoamento Pat decide ler todos os livros de leitura obrigatória das aulas de Inglês que a sua mulher lecciona: O Grande Gatsby (F. Scott Fitzgerald), Adeus Às Armas (Ernest Hemingway), O Apanhador no Campo de Centeio (J.D.Salinger), As Aventuras de Huckleberry Finn (Mark Twain) e A Redoma de Vidro (Sylvia Plath). As suas críticas e impressões sobre estes livros são muito honestas e divertidas de ler, ele leva certos acontecimentos dos livros como afrontas pessoais e não se coíbe de o demonstrar. 
Em suma este é um livro bem construído, com algumas surpresas e temas contemporâneos e com uma mensagem de esperança e optimismo que podemos transportar para as nossas vidas. Certamente irá agradar a apreciadores de romances.
A adaptação cinematográfica apresenta algumas diferenças em relação ao livro, existem algumas diferenças nas relações entre personagens, acontecimentos importantes e desde o princípio sabemos o que levou ao colapso mental de Pat o que estraga um pouco o suspense. Apesar de manter o mesmo "espírito" e de estar na minha opinião bem conseguida recomendo que leiam primeiro o livro.




terça-feira, 5 de março de 2013

Blankets


Título: Blankets
Autor: Craig Thompson
Editora: Devir/ Biblioteca de Alice
592 páginas, capa dura

Classificação: ***** (5/5)

Diálogos, silêncios, padrões e ilustrações a preto e branco conseguem compor esta história de descoberta e crescimento. 
Esta é uma graphic novel de inspiração autobiográfica que relata episódios da infância e adolescência de Craig: a sua relação com o irmão, com os país católicos fervorosos, com a fé, a necessidade de evasão e o seu primeiro amor e a criação de uma identidade própria.
Acompanhamos Craig numa viagem desde os seus tempos de criança e à partilha da cama com o seu irmão Phill até à entrada na idade adulta. Pelo meio as inseguranças, dúvidas, emoções, conflitos e descobertas do processo de se tornar adulto contadas com uma certa melancolia e muita sensibilidade e delicadeza. Talvez a facilidade de o leitor se identificar com  as emoções vividas por Craig torne a leitura tão envolvente, mesmo que não tenhamos sido educados da mesma forma que ele e vivido as mesmas experiências, certas emoções são universais.
Para mim um dos principais temas do livro é a relação de Craig com a religião, os conflitos vividos entre a fé fervorosa dos seus pais e de quem o rodeia e a sua própria fé, ou falta dela, a necessidade de questionar e os ensinamentos com que foi criado e os sentimentos de culpa e dúvida que o atormentam. Surge desde cedo a necessidade de evasão, o prazer de ultrapassar os seus limites através do desenho que Craig começa por negar a si próprio. 

Outro é a descoberta do amor. Craig conhece Raina num acampamento católico e o seu amor é correspondido, o tímido e solitário rapaz conhece a descontraída e maternal rapariga apaixonam-se. Surgem as primeiras descobertas, dúvidas e desejos. Raina lida com uma série de problemas pessoais que também influenciam o desenvolvimento da relação de ambos. Os momentos com Raina dominam a maior parte do livro e são plenos de emoção, inocência e delicadeza. 



É ela, sua musa, que oferece a Craig uma manta de retalhos que fez, que para mim simboliza de certa forma a vida e a construção de uma identidade, todos os diferentes pedaços de tecido diferentes são as pessoas, sentimentos e vivências que constroem uma identidade.
O final é um pouco agridoce mas apesar de tudo necessário e promissor. 
Adorei a construção da história, a maneira como os desenhos conseguem transmitir tão bem sentimentos complexos e muito pessoais sem serem sequer necessárias palavras sendo ao mesmo tempo tão bonitos de observar. É um livro de uma extrema sensibilidade, que apela ao sentimento e que nos atinge de forma pessoal pela sua delicadeza, honestidade e beleza. Recomendo a qualquer pessoa que não tenha um bloco de gelo no lugar do coração. 

"Como é gratificante deixar uma marca numa superfície branca. Desenhar um mapa do meu movimento - não importa quão temporário."
Blankets, Craig Thompson